Paulo Calçada identifica-se como um empresário que trabalha em tecnologias inovadoras relacionadas com a comunicação, trabalho colaborativo e plataformas abertas. E é na Porto Digital, como administrador executivo, que coloca tudo isto em prática e até mais.
(Marta Pinto) – Olá, este é o podcast do Culture Code, eu sou a Marta.
(Luis Simões) – E eu sou o Luis, e ambos fazemos parte da LemonWorks, onde ajudamos empresas a criar um ambiente de trabalho com propósito e significado.
Paulo Calçada identifica-se como um empresário que trabalha em tecnologias inovadoras relacionadas com a comunicação, trabalho colaborativo e plataformas abertas. E é na Porto Digital, como administrador executivo, que coloca tudo isto em prática e até mais. Os portuenses já beneficiaram certamente de muitos projetos nas áreas das TIC desenvolvidos pela Porto Digital, uma associação privada sem fins lucrativos criada por 3 grandes parceiros desta cidade: a Câmara Municipal do Porto, a Universidade do Porto e a Associação Empresarial de Portugal, em colaboração com a empresa Metro do Porto.
(Paulo) Mas também sou muito analógico. Olha, continuo a usar o meu quadro.
(Marta) Estou a ver. E diz Porto Digital no título.
(Paulo) Isso eu pus, porque…
(risos)
(Luis) Foi só por causa da sessão, não é? Já percebi.
(risos)
(Paulo) Não, eu tenho várias sessões e … reparem aqui no pormenor, acho que não se vê muito bem, aqui do livro do Porto Ponto.
(Luis) Do livro do Porto Ponto virado. Já percebi. Estrategicamente posto.
(risos)
(Marta) Paulo, muito obrigada por te teres juntado a nós no podcast e teres aceite o convite de partilhares connosco como é que é a cultura de trabalho da Porto Digital, e conversarmos um bocadinho sobre a tua experiência, também, de trabalho na Porto Digital.
(Paulo) Muito obrigado pelo desafio. É com enorme gosto que estou aqui com vocês a partilhar a nossa experiência, visão e trabalho.
(Marta) Que bom. Paulo, uma primeira pergunta. Se tu tivesses que explicar a uma criança de 10 anos do Porto, uma criança Portuense, o que é que é o teu trabalho, como é que explicarias?
(Paulo) Faço isso, eu diria, regularmente lá em casa. Eu tenho três rapazes. Um tem seis, outro tem 15 e o outro tem 12 e vai fazer 13, portanto tenho regularmente que explicar o que é que faço. Não é fácil. Eles ficam muito contentes quando vêem algumas das coisas que eu vou fazendo na rua. Vou mostrar uma coisa que quem nos está a ouvir não vai poder ver, por tanto coisas como estas (o Paulo mostrou beacons). Ficam contentes quando vêem coisas como estas na rua, porque de facto eu tenho dificuldade às vezes em explicar-lhes o que é aquilo que eu faço. O que é que nós fazemos aqui? O meu papel em particular é um pouco diferente. Normalmente o que eu tento explicar é – ‘Imaginem que têm um problema, um que ainda nem conhecem muito bem, é uma coisa que vocês querem resolver mas apesar de tudo ainda não conhecem muito bem. Imaginem que também têm muitas ferramentas para resolver esse problema. Não nos faltam ferramentas, só que as coisas não casam…vocês não estão a conseguir utilizar as ferramentas, não estão a conseguir resolver o problema. Por tanto é um pouco isso que nós fazemos.’ Ajudar as pessoas com quem trabalhamos, ajudar as pessoas que trabalham na cidade, em primeiro lugar a perceber melhor os problemas que têm e depois, em conjunto, conseguimos recorrer às ferramentas que estão disponíveis. Nomeadamente ferramentas tecnológicas, ferramentas digitais – os telemóveis, os computadores e coisas assim um bocadinho mais complicadas – utilizar essas ferramentas para resolver da melhor forma possível o problema que têm. É esse o trabalho que eu faço, e que a equipa da Porto Digital faz.
(Luis) E no teu caso em específico, como é que a tua história de vida se cruzou com este trabalho que tens agora.
(Paulo) É sempre difícil contar uma história, mas talvez duas possam ajudar. Uma delas é simples. Eu estava na cozinha com a minha mãe, e estava agarrado a um fio elétrico a berrar, e a minha mãe estava a dizer ‘Paulo, para quieto. Lá estás tu a fazer outra vez uma grande barulheira’. Não, eu estava era mesmo agarrado ao fio elétrico, e apanhei um grande choque elétrico e fiquei com duas marcas aqui na mão… foi muito engraçado, porque houve assim um circuito que fechou. Eu fiquei muito surpreendido com a reação da minha mãe por um lado, mas acima de tudo com o que se passava ali naquela minha interação com os fios elétricos. Eu disse: eu tenho que perceber isto um bocado melhor. E como essa há mais histórias de deitar a luz abaixo, de rebentar com os circuitos. E de facto pensei que dava jeito perceber um pouco melhor o que é que é isto da eletricidade, o que é que é isto da eletrónica, o que é que é isto da Internet? Porque eu cresci com a internet. Eu desenvolvi páginas web sem ter acesso à internet. Comprava revistas, já tinha computador, montávamos a nossa rede em casa, eu e os meus irmãos, e depois íamos explorando e montando a nossa pequena internet em casa, o que também teve alguma graça. Mas não é só isto. Eu sou eletrotécnico de formação, hoje em dia mexo pouco no bit e no byte, mexo pouco, felizmente, nos eletrões. Mas também há uma outra área, é que eu gostava de ser cineasta. Eu gostava de contar histórias e portanto, andava ali um bocado dividido se ia para eletrotecnia ou se ia para cinema. Como cinema naquela altura era ‘Tem juízo que isto não dá emprego a ninguém’ decidi seguir em frente. A verdade é que tenho a felicidade de hoje em dia na Porto Digital, andar um pouco à volta das duas coisas. Da tecnologia, e eu felizmente já sei o que é que é a corrente elétrica, é o movimento ordenado dos eletrões. Que foi uma coisa que nunca mais esqueci, porque houve um professor que passou uma rasteira e me perguntou isso para aí no terceiro ano – ‘Define a corrente elétrica!’… e eu – ‘Ei a sério professor! Estava aqui para resolver integrais, e pergunta-me o que é a corrente elétrica!’ Mas acima de tudo a felicidade que tenho na Porto Digital é este trabalho que nós desenvolvemos no sentido de ajudar a usar a inovação na transformação da cidade. A usar a inovação e tecnologia na resolução de problemas. Ajudar os cidadãos, mas não só. Muito também as equipas municipais, os técnicos do município a ter um melhor uso da tecnologia para dar respostas aos desafios de forma eficiente. Na realidade resume-se muito a contar uma história, a contar histórias, a perceber ‘Ok, qual é o desafio que eu tenho, de que forma é que eu vou abordar esse desafio, e quais são os resultados que eu espero de ter’. Esta ideia de contar histórias, esta ideia de levar as pessoas a compreender alguma coisa e a perceber se esse alguma coisa que as pessoas queriam vir a compreender, se transforma em realidade, é algo que eu gosto muito. Pronto, isto depois foi crescendo, foi crescendo os cabelos brancos. O meu papel na Porto Digital é diretor executivo, uma coisa um bocado pomposa não é? Mas está sempre muito próxima desta componente de ajudar a equipa a contar histórias. A contar histórias que elas próprias se motivem no sentido de perceberem onde é que estão. Isto também tem muito a ver com a tal cultura que gostávamos puder vir a construir-se.
(Luis) Estava a ouvir, sobretudo em relação a essa parte do exame de eletrotecnia, e eu pensei que ias responder a essa pergunta do que é a eletricidade, com a tua história de teres posto (risos) acho que era a melhor forma de responder.
(Paulo) Com este professor não havia muitas tangas (risos)…
(Luis) Ah ok (risos).
(Paulo) Eu uma vez armei-me um bocadinho em esperto, para aí no último teste que fiz de português no 12º ou no 11º ano – porque eu sou do tempo em que no 12º ano só havia três disciplinas – e correu-me um bocadinho mal. Por tanto…é melhor não.
(Marta) A esse momento mais formal e inicial de criação da equipa, porque depois já entrado na equipa da Porto Digital….vais agora criar duas curtas metragens, criar o storyboard… Como é que tu contrarias numa curta-metragem, o que é o lado mais óbvio da cultura de trabalho da Porto Digital. E depois outra curta metragem em que tu mostrasses o outro lado, aquilo que vai para além do óbvio e do que acontece na Porto Digital.
(Paulo) O óbvio, é termos a oportunidade de desenvolvermos projetos com impacto na vida de todos. Na nossa equipa e naquilo que é a vida da cidade. Isso é o mais óbvio. O mais óbvio parece-me ser esta oportunidade e é isso que tem motivado muito as pessoas que se têm juntado a nós. O que é menos óbvio é que isto não se faz sem algum suor, e sem algumas lágrimas e sem algum esforço adicional. Porque de facto temos um conjunto grande de limitações que são naturais numa organização que tem um âmbito de ação como aquele que nós temos. Se bem que, é algo muito importante e que é típico nas organizações que estão dentro da esfera que é o setor público…é típico que se desenvolvam serviços e se desenvolva uma cultura muito em base no esforço. Acontece muito essa ideia de que o técnico tem de ser capaz de dar resposta a tudo e mais alguma coisa, e se não está disponível e se não consegue é porque não é um bom técnico. Nós queremos muito contrariar esse espírito, e criar uma estrutura para que as pessoas possam ter o seu próprio espaço, para que possam usufruir da sua vida e para que a Porto Digital seja também um espaço de crescimento pessoal. E que o sair às cinco – ‘ai jesus que sacrilégio que é!” Não, saiu às cinco e tem todo o direito de sair às cinco, porque o trabalho está em ordem, é esse o horário de saída. Portanto é esse o grande objetivo. E isso pode não parecer, mas é um espírito que não é fácil de incutir, nomeadamente a quem vem da área técnica. Nomeadamente quem está apaixonado pelos projetos que desenvolve, porque às vezes também é um bocadinho…
(Luis) Também é conflituoso…
(Paulo) É claro.
(Luis) Estavas a falar dessa perspectiva de, no fundo, acho que isso é possível quando há colaboração. Não se vê uma pessoa como ter de dar resposta a tudo. Como é que vocês promovem a colaboração na Porto Digital?
(Paulo) Acima de tudo com muito diálogo. Claro que com a pandemia tudo é diferente, tudo tem sido diferente. A adaptação ao digital no nosso caso tem sido relativamente fácil, porque já vínhamos com esse espírito de muitos projetos que temos desenvolvido, nomeadamente projetos internacionais. Mas acima de tudo com diálogo. Houve uma ou duas discussões que tivemos várias vezes, que era o típico da discussão entre open space ou não open space, não é. Porque o open space não é o segredo para o sucesso de uma empresa. Também não é um demónio naquilo que possa ser como as equipas têm de trabalhar. Acima de tudo tem que haver disciplina, e isso às vezes as pessoas esquecem-se – ‘Sim senhora, um ambiente descontraído, mas temos de compreender o nosso espaço e o espaço dos outros.’ E é essa cultura de alguma disciplina, de algum cuidado com o outro tem que surgir. Mas, como disse, é importante o diálogo mas também é muito importante, e voltando um pouco ao início, as pessoas compreenderem o que nos motiva do ponto de vista pessoal e do ponto de vista organizacional. É muito importante termos sempre presente aquilo – ‘Qual é o nosso driver no concreto!’ No abstrato já percebemos que todos queremos mudar a cidade, transformar a cidade na melhor cidade do mundo. Mas no concreto quais são os grandes drivers, quais são os grandes projetos que nos estão a desenvolver para que não haja aqui uma espécie de gota no oceano….em que parece que não está a acontecer nada. A pessoa gasta muita energia e depois não vê as coisas a mexer. Este diálogo tanto do nosso lado mais de coordenação e gestão da Porto Digital, mas também do ponto de vista das equipas, ser uma coisa em que há feedback. Depois como há áreas de ação muitíssimo diferentes, cruzar tudo isto é relativamente exigente, e necessitamos de diálogo, muita transparência, muitos ecrãs onde se mostra o que está a acontecer, onde se mostra o número de utilizadores que estão ligados à nossa rede wifi enquanto as pessoas estão a usar os nossos beacons, quantos megabytes por segundo estão a usar os nossos circuitos… até essa componente mais visual e gráfica, do que está a acontecer, para nós é muito importante.
(Marta) Esse diálogo pelo que estou a depreender pelas tuas palavras, é muito importante não com os parceiros externos, as pessoas externas com quem colaboram para fazer tudo acontecer, mas também um diálogo muito presente na equipa coração, na equipa da Porto Digital. Isso também envolve…tu falaste aí em feedback… também envolve momentos de feedback, uma certa cultura, uma certa rotina, um hábito de dar feedback uns aos outros quando estão a trabalhar. Isso é promovido, acontece?
(Paulo) Acontece pelo menos uma vez por mês. Nós gostamos que acontece de forma mais orgânica, mas não dentro do caos. Muitas das vezes é tão orgânico que as pessoas nem se apercebem que têm um colega ao lado concentrado noutro desafio, e não num problema que tem de resolver naquele momento. E esse equilíbrio nós temos que conseguir. No open space não pode ser uma espécie de um espaço sagrado onde nada acontece, mas tem que haver um equilíbrio entre aqueles momentos mais espontâneos em que de repente as pessoas estão a partilhar os stresses ou uma pequena vitória que tiveram naquele dia…ou o jogo da Inglaterra com a Dinamarca…também pode acontecer, também faz sentido. Depois temos que procurar momentos um bocadinho mais regulares. Temos uma coisa chamada Porto Digital Big Picture, que é uma espécie de um encontro que temos regularmente, onde se apresentam projetos que estamos a desenvolver, as áreas de ação que estamos a trabalhar, e onde se pede feedback. Coisas que em princípio podem não estar relacionadas com o desafio que eu hoje tenho que tratar ou que amanhã terei que tratar, mas pedimos este esforço adicional às equipas que estejam atentas. Por muito que seja muito técnico, tentem… se não estão a perceber… e esta vossa excelente pergunta inicial…é um pouco esse o espírito ‘Olha, eu não estou a perceber, mas explica lá outra vez.’
(Luis) Estavas a explicar isso e eu estava a perceber que parece, de estar a ouvir, que a maneira como vocês preferem decidir, resolver os problemas é acima de tudo através do diálogo e não tanto através de regras.
(Paulo) Sim.
(Luis) Mas obviamente que o diálogo leva a uma perspectiva que é: pessoas terem perspectivas diferentes, e aquilo que às vezes dizemos com o – ‘vamos decidir com o senso comum’, mas o senso comum é diferente por causa da nossa educação e da experiência que tivemos. Como é que é quando existem conflitos, como é que eles se resolvem? As pessoas têm a maturidade de conseguir resolvê-los? Têm algum formato para o fazer? Como é que vocês lidam com essas situações?
(Paulo) Isto, estamos todos ainda a aprender. A equipa da Porto Digital é uma equipa relativamente nova. Neste momento somos perto de 30. Éramos nove quando eu cheguei à Porto Digital, dos quais ficaram dois. Tenho dito muitas vezes que a Porto Digital será muito aquilo que as pessoas que estão na Porto Digital queiram que ela seja, dentro obviamente da visão estratégica, do mandato que temos, blá, blá, blá… que eu vos acabei de falar, que não posso esquecer que existe e é muito isso que nos orienta. É como referi e repeti, este espírito de discussão é fundamental. Depois um outro ponto que é importante é que as discussões são fundamentais, mesmo aquelas que às vezes são um bocadinho energizadas. Há pessoas que têm maneiras diferentes de reagir, e não há problema absolutamente nenhum de vez em quando a gente levantar a voz e expressar-se de forma um pouco mais intensa. Obviamente com todo o respeito e com toda a sensibilidade que temos que ter com a sensibilidade das outras pessoas que nos envolvem. Muitas das vezes, eu em particular, e dois ou três elementos da equipa, muitas das vezes empolgamo-nos com as discussões e as pessoas ficam um pouco espantadas e preocupadas. Então, é normal. É mau é quando não pomos esta energia cá fora porque não estamos suficientemente interessados nos desafios que temos. As coisas não se resolvem por si, nem se resolvem com discussão descontrolada, e com discussão em que só se coloca o coração e não se coloca a razão. Portanto, temos que procurar aqui um caminho de consenso, de procura de consenso, e acima de tudo isso tem sido possível e tem reinado a experiência que as pessoas vão tendo, que começa a ser reconhecida pelos elementos da equipa que – ‘OK, cedi, resultou… cedi, não resultou…’ É muito elástico, percebes? Eu dou um passo em frente, dou um passo atrás, e tem sido possível. A equipa também tem esta dimensão. Não é uma equipa muito grande. Pois tem sido possível dentro desta elasticidade que deve existir dentro desta organização, conseguir com que se encontrem consensos mesmo quando existe uma hierarquia, mesmo quando existe coordenação, um líder de projeto. Tem sido fácil encontrar estes pontos. Quando as pessoas desistem é que nos chateia. Quando dizem – ‘Pronto, leva lá o prémio.’ Isso às vezes deixa-nos chateados e até provoca uma reação contrária. Porque quando uma pessoa desiste é terrível. Mas não é fácil gerir este bailado, que muitas vezes se constrói para que uma decisão seja tomada. E às vezes é preciso dizer – ‘Terminamos a conversa por aqui, a decisão está tomada. Vamos então seguir em frente e depois avaliaremos e cá estaremos para dar a volta.’ Mas tentar também sempre mitigar os riscos deste tipo de decisão.
(Marta) Esse bailado que tu estás a dizer, foi bonita essa expressão, porque vocês fazem inovação, têm uma equipa jovem constituída…há aqui muito espaço para crescer e para se conhecerem melhor. E haverá também muito espaço para errar e ter muitos sucessos. Como é que vocês integram estes momentos, em que há momentos de erro e momentos de sucesso que acontecem na Porto Digital?
(Paulo) Acima de tudo evitando ao máximo, ao máximo, ao máximo, ao máximo, ao máximo, aquela velha expressão – ‘ Eu bem te disse!’ Pá, isso acontece, é normal. Mas quando começa assim começa logo mal, e portanto temos que evitar essa do ‘Eu bem te disse’. Temos gasto algum do nosso tempo nesta fase de crescimento e de aprendizagem em corrigir esse erro do ‘Eu bem te disse’. Sim, temos que incorporar sempre este erro…e estamos numa área que é sempre uma área discutível, muito exigente, e portanto é muito importante ser capazes de assumir que a decisão que estamos a tomar é a decisão com algum risco. e portanto como há algum risco… têm de ser riscos mitigados como estava a referir, porque estamos a falar de gestão de dinheiros públicos, estamos a falar de uma exposição grande, por isso temos muito que mitigar esses riscos….mas para mitigar os riscos, incorporamos nas metodologias e nos processos que temos, este processo de feedback. Nós lançamos agora estas iniciativas chamadas Pod Porto, e como sabíamos que era uma iniciativa de elevado risco, demoramos dois anos no terreno a desenhar os nossos beacons, a validar os nossos beacons, a validar a cor, a perceber se as pessoas olhavam para o QRcode e iam lá com curiosidade validar. Portanto, não íamos por 1300 coisas destas na cidade, sem ter uma mínima noção se fazia ou se não fazia sentido. Sendo engenheiro eu acho que tem que haver aqui um conjunto de processos que nos leve a atingir um resultado, e que esse resultado seja muito próximo do que nós queríamos que fosse, mas ao mesmo tempo adaptarmo-nos e introduzir aqui a capacidade de recolher contributos. Isto é giro porque a própria equipa, é uma equipa muito multidisciplinar. Nós temos farmacêuticos, temos designers, temos engenheiros, temos farmacêuticos que são dev-ops, e isso também acho que enriquece bastante a equipa, o ser multidisciplinar do ponto de vista da sua formação base.
(Luis) Há pouco falavas daquela parte de que… eu vou usar o exemplo do sair às cinco, porque é um exemplo bom porque ao mesmo tempo, para bem e para mal, quando as pessoas falam da função pública falam desse exemplo de as pessoas saírem às cinco e acabou. Dá para perceber pelo teu discurso que ao mesmo tempo, a paixão que vocês têm, tal como muitas pessoas na função pública, o sair às cinco não quer dizer nada porque as pessoas apaixonam-se por aquilo que estão a fazer. E às vezes tanto numa perspectiva privada como na função pública nós deixamo-nos levar pelos projetos. Para além dessa perspectiva de lembrar que isso é possível, que mais coisas é que vocês fazem para conseguir esse equilíbrio entre a vida pessoal, aquilo que são as minhas necessidades pessoais e as necessidades dos projetos que provavelmente têm momentos de maior pico, provavelmente têm momentos em que se calhar estão mais lentos. Como é que lidam com isso?
(Paulo) Acima de tudo tentar criar as condições para que em termos daquilo que é as necessidades de recursos sejam eles internos, sejam eles em termos de recursos humanos equipa, sejam eles de um ecossistema de parceiros e de fornecedores que nos servem um pouco de amortecedor para esta elasticidade que nós temos que ter na capacidade de resposta. Hoje em dia temos projetos de uma determinada dimensão, amanhã podemos ter outra, e portanto as pessoas têm que perceber que a equipa é uma equipa capaz de dar resposta, capaz de dar resposta aos desafios. E para isso é preciso… e quando é uma organização relativamente nova, também ter uma avaliação muito detalhada e exigente daquilo que são esses desafios. Portanto, estruturar bem isso. Não ao limite, compartimentado, muito rígida, que depois a pessoa não faz mais do que as competências que estão na sua carta de serviço e coisas desse género. Não. Mas ao mesmo tempo, estruturar a equipa, para que ela compreenda de facto quais são os desafios e não ande sempre numa lógica de “apagar fogos” ou numa lógica reativa. Temos que ter capacidade muito mais numa lógica de planeamento. Eu, até em jeito de brincadeira ainda há pouco tempo numa reunião em que estava com parceiros institucionais, dei como exemplo aquele… agora não é uma boa memória porque entretanto fomos eliminados do Europeu, mas não sei se viram um vídeo aí a correr de um jogo entre Portugal com a Hungria, do golo do Cristiano Ronaldo? Eles fizeram 20 e muitos passos até marcarem golo. Daquela forma muito articulada como os elementos estavam, é muito isso. É perceber e tentar que a equipa atinja esse patamar. Eu fui basquetebolista e tenho um pouco esse espírito do trabalho de equipa, de procurar os passos, de marcares – ‘OK eu sou poste, tu és extremo, mas de repente estás na posição de trabalhar essa dinâmica de equipa, conhecendo o seu espaço, conhecendo as suas valências, sabendo-se posicionar, é muito importante. Isso exige preparação física e mental também para que nós saibamos de facto onde é que estamos, o que nos guia, o que nos motiva. E é muito por aí que gostava que a cultura da equipa se fosse desenvolvendo. É por isso que nós precisamos de conversar, é por isso que nós precisamos muito de perceber o que faz fulaninho A e fulaninho B, porque senão eu não vou saber como eu o posso apoiar quando ele não estiver. Porque a equipa funciona como uma equipa. Sabe qual é o seu lugar, cada um dos elementos sabe qual é o seu lugar e ao mesmo tempo sabe que existe toda essa dinâmica, e é tudo é muito fluido, porque tudo o que nos envolve também é fluído. É muito essa dinâmica que queremos trazer para dentro da equipa. E depois, se me permitem mais uma nota porque ainda não falamos sobre isso. Depois é muito importante também ajudar cada um dos elementos da equipa a perceber como é que eles querem crescer e por onde é que querem crescer. Porque um desafios que nós temos, e na área das tecnologias da informação ainda mais, esta rotatividade que existe nos recursos humanos, a enorme pressão que existe nos recursos humanos… e a Porto Digital, como eu referi, tem um conjunto de limitações que tem a ver com o contexto onde nós trabalhamos. Eu não faço o contexto de dinheiro privado, não faço a gestão do meu próprio dinheiro, faço de dinheiros públicos. Por isso tenho um conjunto de limitações, nomeadamente daquilo que podem ser os benefícios, que podem ser os salários que nós podemos pagar. Onde nós nos tentamos posicionar, e isto não é conversa de por para fora, é também lidar com um conjunto de pessoas que obviamente se apaixonem pelos desafios, se apaixonem pela equipa e que consigam perceber como é que podem crescer dentro da equipa. Isso ao mesmo tempo também é muito doloroso, porque nos fomos apegando a pessoas que sabemos que mais cedo ou mais tarde vão sair. Porquê? Porque nós queremos trabalhar com os melhores dos melhores, e os melhores dos melhores não são fáceis de reter na estrutura que nós temos. Porque eu não posso dizer – ‘Toma lá mais x, porque de facto tu estás a gerar uma enorme riqueza para a Porto Digital, estás a gerar uma enorme riqueza para a cidade’, mas eu não tenho naquilo que é o framework que existe que é o setor público, para continuar a reter aqui. E nem faz sentido. Portanto, trabalhar com os elementos da equipa e tentar perceber como é que eles podem crescer connosco, e depois seguem o seu caminho. Este processo aqui de alguma rotatividade é um processo exigente e às vezes difícil de gerir.
(Luis) Eu posso-te dizer que às vezes até pode ser mais saudável do que o caminho que às vezes as organizações procuram, da retenção. Parece quase que é ‘Eu tenho que agarrar aqui as pessoas’. Acho que é mais saudável para a própria organização e para a pessoa, compreender que – ‘Isto é uma relação que estamos a ter, como é que podemos nos beneficiar, sabendo que um dia pode terminar.’ às vezes acho que essa conversa pode ser de facto muito saudável. E saber encarar isso, e se mais empresas tivessem essa competência, provavelmente se calhar até as pessoas ficavam mais tempo do que ficam.
(Paulo) É muito assim que nós temos trabalhado. Eu quase desde o início da carreira que fui gerindo equipas, fui fazendo crescer equipas. E dentro deste contexto é como dizes, acaba por ser benéfico. Porque a manta é curta e não a podemos esticar por muitos lados, portanto vamos trabalhando. E é com alguma felicidade que vou vendo algumas pessoas que trabalharam comigo há 15 anos atrás, a aceitarem o desafio de voltarem a trabalhar comigo. É sinal que alguma coisa correu bem. E as pessoas que saem e as pessoas que entram… há aqui um equilíbrio. É óbvio que tu tens que ter aqui uma espinha dorsal minimamente sólida e uma boa capacidade de retenção de conhecimento. Não de retenção de pessoas, aliás o termo até me aflige um pouco. É retenção de conhecimento. As pessoas têm que ter capacidade de gerar conhecimento para a organização que lhes paga o salário, para a organização que os ajuda a crescer. Se isso não estiver a acontecer, ou a estrutura não está devidamente preparada para essa retenção de crescimento para geração de valor, ou alguma coisa de menos sério está a acontecer. E portanto temos de estar atentos.
(Marta) É isto. Esta ideia de crescimento é sempre muito importante de parte a parte. Paulo, pensando no tempo que já estiveste na Porto Digital, certamente já cresceste muito e fizeste crescer muitos projetos, partilha connosco do que é que mais te orgulhas no teu trabalho na Porto Digital.
(Paulo) Acima de tudo acho que criar esta equipa de base é uma razão de grande satisfação, porque há pessoas que estão connosco desde o início deste desafio que foi lançado em 2015, e que ainda se mantêm connosco. Mas também aquelas que saem e olham para trás e dizem – ‘Foi um bom período.’ Sinto-me bastante orgulhoso por conseguir ir criando esta cultura. Depois do ponto de vista de projeção da cidade, tem sido também muito relevante perceber que criamos aqui uma espécie de receita com tecnologia, com gestão de inovação, com empreendedorismo. Que pode parecer em princípio parecer uma receita difícil de se concretizar ou até de compreender, mas que tem sido motivo de curiosidade por parte de muitas outras cidades, e muitas delas muito mais avançadas do que nós, e com muito maior capacidade de investimento do que nós. Foi um desafio grande, porque também havia uma estrutura complexa da Porto Digital quando iniciei funções. Coisas que não são muito relevantes nem muito importantes, mas que do ponto de vista pessoal foi muito importante porque havia uma estrutura que estava bastante fragilizada da Porto Digital. Havia um litígio em tribunal com uma empresa privada que originou um pagamento de uma indemnização de quase dois milhões de euros. Havia uma parceria público-privada, algo que eu gosto bastante, mas que tinha funcionado mal. Havia a equipa que estava muito fragilizada. Eram nove pessoas das quais só ficaram duas pessoas. Ou seja, todo esse processo de crescimento da estrutura, destes desenhos que estão para aqui na parede e torná-los em realidade, foi uma coisa intensa, dura, mas bastante gratificante.
(Luis) Paulo, muito obrigado pelo teu tempo e por nos contares as tuas histórias. Quem está em casa a ouvir, ou…não sei onde vocês costumam ouvir isto…vão ter aqui direito a uns storyboards que o Paulo foi contando, e espero que tenham gostado. Muito obrigado por teres estado connosco.
(Marta) Obrigada.
(Paulo) Muito obrigado eu. Muito obrigado Luis, muito obrigado Marta, foi uma ótima oportunidade, e chateiem-me sempre que seja necessário.
(Marta) Está combinado.
(Paulo) Abraço grande.
(Marta) Abraço.
(Luis) Combinadíssimo. Obrigado.